Capítulo 10 – Feedback
Secção 10.1 – A Estrutura Geral de Realimentação
Esta secção introduz a estrutura básica de um amplificador com realimentação negativa, usando um diagrama de fluxo de sinal. O sistema é composto por:
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Um amplificador de malha aberta com ganho ;
-
Uma rede de realimentação que devolve parte do sinal de saída à entrada;
-
Um somador que subtrai o sinal de realimentação do sinal de entrada , resultando no sinal que entra no amplificador.
O sinal de realimentação é uma fração da saída , dada por . O ganho da malha fechada é derivado como:
O produto é designado ganho de malha (loop gain). Quando , o ganho do sistema depende principalmente de , o que permite obter ganhos precisos e estáveis, pois é normalmente determinado por componentes passivos.
A secção reforça também o conceito de sinal de erro , que tende para zero quando o ganho de malha é elevado, promovendo uma operação linear do amplificador.
Secção 10.2 – Algumas Propriedades da Realimentação Negativa
Nesta secção, discutem-se os principais benefícios da realimentação negativa:
1. Desensibilização do Ganho:
Reduz a sensibilidade do ganho da malha fechada a variações no ganho do amplificador. Um pequeno desvio em causa uma variação muito menor em , dependendo da quantidade de realimentação .
2. Extensão da Largura de Banda:
Para um amplificador com uma única frequência de corte , a aplicação de realimentação negativa aumenta a frequência de corte para:
Reduz-se o ganho, mas aumenta-se a largura de banda, mantendo constante o produto ganho-largura de banda.
3. Redução de Interferência:
Ao intercalar um amplificador livre de interferências antes do estágio sujeito a ruído e aplicar realimentação, melhora-se a relação sinal/interferência. O benefício só ocorre se a interferência puder ser isolada de forma prática.
4. Redução da Distorção Não Linear:
A realimentação reduz as variações no ganho devido a não linearidades internas do amplificador. Isto resulta numa característica de transferência mais linear, embora com um ganho menor. A saturação, no entanto, não pode ser corrigida por realimentação.
Secção 10.3 – As Quatro Topologias Básicas de Realimentação
Esta secção classifica amplificadores em quatro tipos, com base nas quantidades de entrada e saída, e associa a cada um uma topologia de realimentação apropriada:
1. Amplificadores de Tensão:
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Entrada: tensão
-
Saída: tensão
-
Topologia: série–shunt (mistura série na entrada, amostragem shunt na saída)
-
Efeitos: aumento da resistência de entrada, diminuição da resistência de saída
2. Amplificadores de Corrente:
-
Entrada: corrente
-
Saída: corrente
-
Topologia: shunt–série (mistura shunt na entrada, amostragem série na saída)
-
Efeitos: diminuição da resistência de entrada, aumento da resistência de saída
3. Amplificadores de Transcondutância:
-
Entrada: tensão
-
Saída: corrente
-
Topologia: série–série
-
Efeitos: aumento das resistências de entrada e saída
4. Amplificadores de Transresistência:
-
Entrada: corrente
-
Saída: tensão
-
Topologia: shunt–shunt
-
Efeitos: diminuição das resistências de entrada e saída
Cada topologia é ilustrada com circuitos práticos, mostrando como a realimentação é implementada e como se garante que seja negativa.
Secção 10.4 – O Amplificador de Tensão com Realimentação (Série–Shunt)
10.4.1 – Caso Ideal
A estrutura ideal de um amplificador de tensão com realimentação série–shunt é composta por:
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Um amplificador de malha aberta com resistência de entrada , ganho de tensão e resistência de saída ;
-
Uma rede de realimentação que mistura em série na entrada e amostra em paralelo (shunt) na saída;
-
Fontes e cargas absorvidas no bloco do amplificador.
O ganho de tensão com realimentação é:
A resistência de entrada com realimentação aumenta:
A resistência de saída com realimentação diminui:
Estes efeitos são desejáveis num amplificador de tensão: entrada alta impedância, saída baixa impedância, e ganho estável.
10.4.2 – Caso Prático
Na prática, a rede de realimentação pode carregar o amplificador e alterar os valores de , , e . Para lidar com isso, Sedra e Smith recomendam:
-
Representar a rede de realimentação com parâmetros h (modelo híbrido), pois facilita a análise de ligações série (entrada) e shunt (saída);
-
Desprezar o parâmetro , assumindo que a rede de realimentação é passiva;
-
Determinar o bloco A (amplificador base) incluindo os efeitos da carga e da fonte;
-
Determinar , medindo a proporção entre o sinal na entrada e na saída da rede, com entrada aberta (devido à ligação série).
10.4.3 – Resumo
Para sistemas com realimentação série–shunt:
-
Curto-circuita a porta ligada em shunt;
-
Abre a porta ligada em série;
-
Determina , , , e com estas condições;
-
Aplica as fórmulas:
-
Dois exemplos (com amplificadores operacionais e MOSFETs) são trabalhados com valores numéricos para ilustrar o processo.
Secção 10.5 – O Amplificador de Transcondutância com Realimentação (Série–Série)
10.5.1 – Caso Ideal
Este tipo de amplificador:
-
Recebe uma tensão de entrada;
-
Fornece uma corrente de saída (ganho );
-
Utiliza realimentação série na entrada e série na saída.
O sistema ideal consiste num:
-
Amplificador de malha aberta com entrada de resistência , saída , e transcondutância ;
-
Rede de realimentação que converte a corrente de saída numa tensão , que é subtraída de .
Ganho com realimentação:
Efeitos principais:
-
A resistência de entrada aumenta: ;
-
A resistência de saída aumenta: .
10.5.2 – Caso Prático
O processo para análise prática é semelhante ao da secção anterior:
-
Representa-se a rede de realimentação com parâmetros z (impedância), já que as ligações série aparecem tanto na entrada como na saída;
-
O parâmetro pode ser obtido medindo a tensão de realimentação em função da corrente de saída;
-
A resistência de entrada considera o efeito de abrir a porta de saída;
-
A resistência de saída é calculada com a porta de entrada aberta.
Secção 10.6 – O Amplificador de Transresistência com Realimentação (Shunt–Shunt)
10.6.1 – Caso Ideal
O amplificador de transresistência converte corrente de entrada em tensão de saída:
A realimentação:
-
Amostra a tensão de saída (shunt na saída);
-
Injeta uma corrente de realimentação na entrada (shunt na entrada).
Rede ideal:
-
O amplificador tem resistência de entrada , resistência de saída , e ganho ;
-
A rede fornece , sendo misturado com para produzir .
Ganho com realimentação:
Efeitos principais:
-
A resistência de entrada diminui:
-
A resistência de saída diminui:
10.6.2 – Caso Prático
Nesta topologia:
-
Utilizam-se parâmetros y (admitância) para descrever a rede de realimentação;
-
A porta de entrada é shunt (mistura em paralelo), portanto deve ser curto-circuitada para calcular os efeitos da carga;
-
A porta de saída também é shunt, sendo curto-circuitada para isolar a rede.
Determina-se aplicando uma tensão à saída e medindo a corrente injectada na entrada (com entrada em curto-circuito).
Secção 10.7 – O Amplificador de Corrente com Realimentação (Shunt–Série)
10.7.1 – Caso Ideal
Este amplificador:
-
Recebe uma corrente de entrada;
-
Fornece uma corrente de saída;
-
É caracterizado por um ganho de corrente ;
-
Utiliza uma topologia shunt–série, ou seja, mistura em paralelo na entrada e amostra em série na saída.
A estrutura ideal inclui:
-
Um amplificador com resistência de entrada , resistência de saída , e ganho de corrente ;
-
Uma rede de realimentação que converte a corrente de saída numa corrente que é subtraída da corrente da fonte , produzindo .
O ganho com realimentação:
As resistências alteram-se da seguinte forma:
-
A resistência de entrada diminui:
-
A resistência de saída aumenta:
10.7.2 – Caso Prático
Utiliza-se o modelo g (transcondutância/admitância) para a rede de realimentação, apropriado para conexões shunt (paralelas). Para determinar os efeitos da rede:
-
A porta de entrada (mistura shunt) é curto-circuitada;
-
A porta de saída (amostragem série) é aberta.
Para obter , aplica-se uma corrente na saída e mede-se a corrente de realimentação que entra na entrada, com esta em curto-circuito.
Secção 10.8 – Resumo do Método de Análise com Realimentação
Esta secção sintetiza o método sistemático para analisar qualquer amplificador com realimentação negativa, dividido nos seguintes passos:
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Identificar o tipo de amplificador (tensão, corrente, transcondutância ou transresistência);
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Determinar a topologia de realimentação adequada (série–shunt, série–série, shunt–shunt ou shunt–série);
-
Isolar o circuito A (malha aberta), incluindo os efeitos das resistências de fonte e carga, bem como da rede de realimentação (através da sua carga);
-
Determinar o ganho de malha aberta , resistência de entrada e de saída ;
-
Determinar o fator de realimentação ;
-
Calcular o ganho com realimentação:
-
Calcular as resistências com realimentação com base na topologia:
Topologia | ||
---|---|---|
Série–shunt | ||
Série–série | ||
Shunt–shunt | ||
Shunt–série |
Este resumo serve como um guia rápido para a análise de qualquer circuito com realimentação.
Secção 10.9 – Determinação do Ganho de Malha (Loop Gain)
O ganho de malha
é um parâmetro central na análise de amplificadores com realimentação negativa.
Método de Determinação:
-
Abrir a malha – rompe-se o laço de realimentação num ponto apropriado do circuito;
-
Inserir uma fonte de teste no ponto de ruptura (pode ser uma fonte de tensão ou corrente, conforme a topologia);
-
Calcular a resposta do sistema à fonte de teste;
-
O ganho de malha é definido como:
Observações:
-
A abertura da malha deve preservar a impedância de entrada e saída originais;
-
Esta abordagem é particularmente útil quando se pretende analisar a estabilidade do sistema;
-
Será usada nas secções seguintes para estudar o problema da estabilidade e a compensação em frequência.
Secção 10.10 – O Problema da Estabilidade
A realimentação negativa, embora traga vantagens (ganho estável, menor distorção, etc.), pode comprometer a estabilidade do amplificador quando envolve sinais dependentes da frequência.
Oscilações não desejadas:
-
Um sistema com realimentação negativa pode tornar-se instável e entrar em oscilação se o ganho de malha se tornar negativo (i.e., com mudança de fase de 180° e magnitude ≥ 1).
-
Esta oscilação ocorre quando a realimentação se transforma efetivamente em positiva a certas frequências, devido a efeitos de fase introduzidos por múltiplos polos.
Critério de estabilidade:
-
Um amplificador com realimentação é potencialmente instável se, para alguma frequência, a magnitude de for ≥ 1 e a fase total for 180°.
-
Para garantir estabilidade: quando , a magnitude deve ser inferior a 1.
Exemplo: AmpOp realimentado:
-
Um AmpOp com múltiplos polos e sem compensação pode oscilar quando usado com realimentação.
Secção 10.11 – Efeito da Realimentação sobre os Polos do Amplificador
Esta secção examina como a realimentação altera a resposta em frequência, modificando os polos do amplificador.
Amplificador de malha aberta com dois polos:
Ganho:
Com realimentação:
Efeitos principais:
-
Polos deslocam-se para frequências mais elevadas:
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Os polos movem-se para a direita no plano complexo (frequência aumenta);
-
Isso resulta num aumento da largura de banda do sistema;
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-
Separação entre os polos diminui:
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Quanto mais separados os polos estiverem no amplificador de malha aberta, mais benéfico é o efeito da realimentação;
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-
Realimentação pode alterar a natureza dos polos:
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Polos reais podem tornar-se complexos conjugados;
-
Se o sistema se aproximar de um par de polos com parte real pequena, pode gerar picos na resposta em frequência (ressonância).
-
Conclusão:
A realimentação negativa melhora a largura de banda mas pode também reduzir a margem de estabilidade, exigindo atenção à posição dos polos.
Secção 10.12 – Estudo da Estabilidade com Diagramas de Bode
A estabilidade pode ser avaliada visualmente com o uso de diagramas de Bode para o ganho de malha
.
Critérios importantes:
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Margem de fase (PM):
-
A diferença entre a fase de e -180° quando ;
-
PM ≥ 45° é geralmente desejável para garantir estabilidade e evitar picos excessivos na resposta.
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Margem de ganho (GM):
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O valor de em dB abaixo de 0 dB quando a fase atinge -180°;
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Também deve ser positivo (tipicamente ≥ 10 dB).
-
Etapas para o estudo com Bode:
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Traçar e ;
-
Determinar a frequência de ganho unitário (onde );
-
Avaliar a margem de fase nessa frequência.
Exemplo:
Um sistema com dois polos muito afastados terá boa margem de fase; se os polos forem próximos, a margem pode ser insuficiente e a resposta em frequência exibirá sobre-elevação (overshoot) ou até instabilidade.
Secção 10.13 – Compensação em Frequência
Quando o amplificador realimentado não é estável, é necessário aplicar compensação para controlar o comportamento em frequência.
Objetivo:
Modificar a função de modo que o ganho de malha tenha margens de estabilidade adequadas (PM e GM).
Métodos comuns:
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Compensação por polo dominante:
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Introduz um novo polo de baixa frequência que domina o comportamento;
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Os polos de alta frequência são relegados a frequências mais elevadas;
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Tipicamente usada em AmpOps (por exemplo, através de um condensador de compensação interno);
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Compensação por zero:
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Introduz um zero para cancelar ou deslocar polos;
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Pode aumentar a margem de fase;
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Compensação com realimentação de Miller:
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Utiliza a capacidade de Miller para mover um polo para frequências mais baixas;
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Frequentemente empregada com transístores bipolares ou MOSFETs.
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Compensação interna vs externa:
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Muitos AmpOps são compensados internamente para garantir estabilidade com ganho unitário;
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Noutros casos, o projetista deve dimensionar redes externas para estabilizar o sistema.