Capítulo 32 – Indutância
32.1 Auto-indução e Indutância
Quando fechamos um circuito com uma fonte de força electromotriz (f.e.m.), um interruptor e uma resistência, a corrente não atinge imediatamente o valor final dado por ε/R. À medida que a corrente aumenta, o campo magnético gerado pela corrente cria um fluxo magnético através da área do circuito. Segundo a Lei de Faraday, esta variação de fluxo induz uma f.e.m. no próprio circuito.
A f.e.m. induzida tem sinal oposto à f.e.m. da bateria — por isso chama-se força contra-electromotriz — e resiste ao aumento da corrente, fazendo com que esta cresça de forma gradual. Este fenómeno chama-se auto-indução, porque a variação de fluxo que causa a f.e.m. surge do próprio circuito.
A f.e.m. auto-induzida (eL) é proporcional à taxa de variação temporal da corrente:
onde L é a indutância, uma constante que depende da geometria do circuito (número de espiras, área, comprimento, etc.). Para um enrolamento de N espiras, com fluxo magnético Φ_B através de cada uma:
A indutância mede a oposição a variações de corrente, de forma semelhante ao modo como a resistência mede a oposição ao fluxo de corrente. A unidade SI de indutância é o henry (H), definido como 1 V·s/A.
O exemplo clássico é o solenoide de N espiras, comprimento ℓ (muito maior que o raio) e área A:
Este exemplo mostra que L depende fortemente do número de espiras ao quadrado e da geometria do enrolamento. A analogia com a capacitância (dependência da geometria das placas) e com a resistência (dependência do comprimento e área do condutor) é salientada.
32.2 Circuitos RL
Um circuito RL contém uma resistência e uma bobine (indutor) ligadas em série a uma fonte de f.e.m. A presença de uma bobine impede mudanças instantâneas na corrente. Quando se fecha o interruptor, a corrente começa em zero e cresce de forma exponencial, pois a força contra-electromotriz da bobine opõe-se ao aumento.
Aplicando a lei das malhas de Kirchhoff:
Resolvendo a equação diferencial obtém-se:
com a constante de tempo:
Esta constante representa o tempo necessário para a corrente atingir 63,2% do valor final (ε/R). Quanto maior a indutância L ou menor a resistência R, mais lenta será a resposta do circuito.
Quando a fonte é desligada (substituída por um curto-circuito), o circuito passa a ter apenas a resistência e a bobine. A corrente decresce exponencialmente:
A bobine impede que a corrente caia instantaneamente a zero. A força contra-electromotriz gerada tenta manter a corrente, libertando a energia armazenada no campo magnético.
Em resumo, a bobine «suaviza» as variações de corrente, criando uma resposta "preguiçosa" ou atrasada às mudanças de tensão.
32.3 Energia num Campo Magnético
Quando uma bobine conduz corrente, armazena energia no seu campo magnético. Parte da energia fornecida pela fonte é dissipada em calor na resistência, mas parte é armazenada como energia magnética na bobine.
A taxa de fornecimento de energia pela fonte é:
O termo é a potência dissipada como calor. Já corresponde à taxa de armazenamento de energia na bobine. Integrando, obtém-se a energia total armazenada:
Esta forma é análoga à energia armazenada num condensador:
Para um solenoide (ou outra distribuição de campo magnético conhecido), podemos calcular a densidade de energia magnética (energia por unidade de volume):
Este resultado mostra que a energia armazenada no campo magnético depende do quadrado da intensidade do campo, de forma semelhante à densidade de energia num campo eléctrico.
Um exemplo trabalhado no texto demonstra que quando a bobine descarrega (por exemplo, num circuito RL isolado), toda a energia inicialmente armazenada no campo magnético se converte em energia interna (calor) na resistência.
32.4 Indutância Mútua
Nesta secção, introduz-se o conceito de indutância mútua. Quando há dois circuitos próximos, a corrente variável num deles pode induzir uma f.e.m. no outro, porque o campo magnético de um atravessa a área do outro.
Imagina duas bobinas próximas (bobina 1 e bobina 2):
-
A corrente i₁ em 1 cria um campo magnético. Parte desse campo atravessa a área de 2, gerando fluxo magnético Φ₁₂ em 2.
-
Se i₁ varia no tempo, Φ₁₂ varia, induzindo uma f.e.m. em 2.
Define-se indutância mútua M₁₂ como:
onde N₂ é o número de espiras da bobina 2.
A f.e.m. induzida em 2 devido a i₁ é:
Analogamente, se i₂ em 2 variar, induz uma f.e.m. em 1:
Pode-se demonstrar que M₁₂ = M₂₁ = M, porque depende apenas da geometria mútua dos circuitos e das suas orientações.
A unidade de indutância mútua é o henry (H), como na auto-indução.
Exemplo prático: carregadores sem fios. Uma bobina na base (primária) cria um campo magnético variável, induzindo corrente na bobina do aparelho (secundária).
32.5 Oscilações num Circuito LC
Nesta secção estuda-se o circuito LC ideal: um condensador ligado a uma bobine, sem resistência e sem radiação electromagnética.
-
Supondo o condensador inicialmente carregado (carga Q_max), quando o circuito se fecha, a energia armazenada no campo eléctrico do condensador começa a transferir-se para a bobine.
-
À medida que o condensador se descarrega, a corrente aumenta, armazenando energia no campo magnético da bobine.
-
Quando o condensador está totalmente descarregado, a energia está toda na bobine.
-
A corrente continua, recarregando o condensador com polaridade oposta.
Este processo repete-se, criando oscilações electromagnéticas entre energia eléctrica (condensador) e magnética (bobine).
Matematicamente:
-
A equação diferencial do circuito é:
-
Solução:
onde
é a frequência angular natural das oscilações.
-
A corrente é:
Observa-se que carga e corrente estão desfasadas de 90°: quando a carga é máxima, a corrente é zero e vice-versa.
A energia total do circuito (conservada no ideal):
oscila entre o campo eléctrico do condensador e o campo magnético da bobine, mas permanece constante no tempo se não houver perdas.
Analogia mecânica: é como um sistema massa–mola sem atrito, em oscilação harmónica simples.
32.6 O Circuito RLC
Aqui estuda-se o circuito RLC em série (resistência R, bobine L e condensador C).
Ao contrário do LC ideal:
-
A resistência provoca dissipação de energia.
-
A energia armazenada no campo eléctrico do condensador e no campo magnético da bobine diminui com o tempo, transformando-se em energia interna (calor) na resistência.
A equação diferencial que descreve o circuito é:
Esta é matematicamente equivalente à equação de movimento de um oscilador harmónico amortecido:
onde:
-
q ↔ posição x
-
i ↔ velocidade dx/dt
-
L ↔ massa m
-
R ↔ coeficiente de atrito b
-
1/C ↔ constante elástica k
Solução para amortecimento fraco (R pequeno):
com
As oscilações são amortecidas: a amplitude decai exponencialmente com o tempo.
Para valores altos de R, as oscilações podem desaparecer totalmente (sobreamortecimento ou amortecimento crítico).
O comportamento geral do circuito RLC inclui:
-
Oscilações amortecidas (R pequeno).
-
Resposta crítica ou sobreamortecida (R grande).
32.7 Resumo
A auto-indução L mede a oposição de um circuito a variações de corrente:
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A energia armazenada num campo magnético é:
-
A densidade de energia magnética (no campo B):
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Indutância mútua M relaciona as f.e.m. induzidas entre dois circuitos:
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Circuito RL: apresenta resposta retardada à variação de corrente, com constante de tempo τ = L/R.
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Circuito LC: oscilações sinusoidais ideais, sem perdas:
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Circuito RLC: oscilações amortecidas, com energia dissipada na resistência.